Recados...

* * * ACOMPANHE OS HORARIOS DE NOSSOS CULTOS EM NOSSO CALENDÁRIO * * *

segunda-feira, 18 de outubro de 2010

REFORMA DA IGREJA ACONTECE PELA FORÇA DA PALAVRA

"A Reforma da Igreja acontece pela força da Palavra

A Reforma da Igreja se faz com a pregação da Lei e do Evangelho, porque somente a Lei e o Evangelho produzem o verdadeiro arrependimento e a verdadeira mudança de vida.

Mensageiro Luterano - Qual o contexto histórico-teológico da Reforma liderada por Martinho Lutero?
Luisivan Velar Strelow - A Reforma da Igreja era um sonho antigo. Bernardo de Claraval (1090-1153) já havia anunciado que, tendo passado a era dos mártires e a dos doutores, viria a era dos reformadores. A falsa segurança dos cristãos, o esfriamento da fé e a acomodação ao mundo ameaçariam a Igreja no fim dos tempos. Os reformadores seriam pregadores do arrependimento, como João Batista.
O clamor pela reforma, na época de Lutero, havia crescido muito. No ano em que Lutero publicou as 95 Teses, terminava um concílio sobre a Reforma da Igreja.
As ordens religiosas também promoviam reformas internas, inclusive a de Lutero. Sua viagem a Roma, em 1510, havia sido para resolver assuntos ligados à reforma da ordem. João Staupitz, superior e responsável pela formação teológica de Lutero, era um reconhecido pregador da Reforma da Igreja e da renovação da piedade monástica. Erasmo de Roterdã e outros humanistas promoviam a Reforma da Igreja pela renovação dos estudos bíblicos e teológicos.
Lutero não se tornou reformador aos denunciar os abusos da Igreja. Ao contrário, a formação de Lutero fez dele um reformador, ou seja, a “descoberta” do Evangelho fez dele o “Reformador”.

ML – Qual a mensagem central (e estratégica) de Lutero na condução deste movimento reformista?
Strelow - Como reformador, Lutero confrontou os vendedores de indulgências. Para ele, a humildade e a cruz eram o caminho do cristão. As indulgências, contudo, promoviam o desprezo à verdadeira penitência ou arrependimento cristão.
A Reforma, para Lutero, não era assunto exclusivo da alta hierarquia da Igreja, mas de cada pastor no cuidado do rebanho que lhe havia sido confiado. Lutero, desde a chegada a Wittenberg, em 1511, conduziu a Reforma em sua esfera de ação, no mosteiro, na igreja e na universidade.
Em Romanos 12.1, 2, Paulo chama os cristãos a não se conformarem ao mundo, mas a deixarem-se transformar pela pregação da Palavra de Deus. Na antiga tradução latina, o texto diz: “reformai-vos pela renovação do vosso pensamento”. O apóstolo repete o “arrependei-vos” da pregação de Jesus e dos apóstolos (Mt 4.17; At 2.38; cf. Mt 3.2). Lutero sempre foi, sob este aspecto, um reformador.
Aos ouvintes na igreja, Lutero pregava contra a piedade, baseado em obras exteriores sem renovação interior;
Aos alunos, na universidade, ensinava que Paulo, na Carta aos Romanos, queria destruir toda confiança em obras e conduzir os homens unicamente à fé em Cristo;
Aos frades agostinianos, ensinava que a teologia da glória busca a justificação por obras, mas que a teologia da cruz busca justificação interior, pela fé em Cristo;
Nas 95 Teses, ensinou a todos que o papa poderia dispensar os cristãos apenas dos castigos impostos pela Igreja, jamais do arrependimento ou da cruz. A teologia das 95 Teses era, deste modo, essencialmente reformatória, pois chamava os cristãos da confiança em obras e coisas exteriores, como a compra de indulgências, para a confiança na graça de Deus em Cristo.

ML – Lutero pode ser caracterizado mais como teólogo (pesquisador) ou como pastor (pregador)?
Strelow - No estudo da teologia de Lutero, as 95 Teses foram relegadas a um segundo plano. A redescoberta de manuscritos de Lutero, no início do século XX, deu força à tendência de estudar Lutero como um pesquisador bíblico moderno e não como um pregador do arrependimento do final da idade média.
Muitos estudos enfatizaram a nova metodologia de interpretação bíblica de Lutero, ou a sua peregrinação intelectual de ruptura com a teologia medieval. Em vista disso, o confronto com os vendedores de indulgências e com as autoridades eclesiásticas teriam servido apenas para afastar Lutero do seu trabalho de pesquisa bíblica e das aulas na universidade.
O centro do debate acadêmico, no século passado, foi ocupado pela questão da gênese ou origem da teologia de Lutero, especialmente em relação à descoberta da doutrina justificação pela fé em Romanos 1.17. A pesquisa sobrevalorizou os textos acadêmicos de Lutero, as anotações que fez sobre os textos bíblicos em preparação para suas aulas, em detrimento das teses e de outros escritos da época. Nestes textos, estariam os vestígios do progresso teológico de Lutero em direção à descoberta que teria feito dele o Reformador.

ML – Como Lutero chegou a compreensão da chamada justiça de Deus?

Strelow - Segundo o relato de Lutero, ele começou expondo os Salmos (1513-1514), mas sentiu-se pouco preparado para a tarefa. Em vista disso, concentrou seus esforços no estudo e ensino de Romanos, Gálatas e Hebreus (1514-1518), antes de voltar a lecionar sobre os Salmos (1519-1521).
A dificuldade estava no termo justiça de Deus, que Lutero compreendia como a punição de Deus aos pecadores. As palavras: “a justiça de Deus se revela no Evangelho, de fé em fé, como está escrito, o justo viverá por fé” (Rm 1.17) estavam lacradas para Lutero, porque ainda interpretava o termo justiça de Deus em sentido jurídico (latino) de punição, e não em sentido teológico (hebraico) de misericórdia.
Em sentido jurídico-latino, o termo justiça de Deus significa a justiça com a qual Deus pune os pecadores. Já, em sentido teológico-hebraico, a expressão deve significar a justiça com a qual Deus salva os pecadores, a justiça de Cristo, o Cordeiro de Deus.
A justiça de Deus revelada no Evangelho é a que recebemos de Deus pela fé (justiça passiva), não a que Deus exige de nós por meio de obras (justiça ativa). Em outras palavras, o Evangelho não revela a dívida do cristão diante de Deus, mas o presente gratuito de Deus para o cristão.
A justiça de Deus é Cristo, o Cordeiro de Deus, e sua obra redentora. O Evangelho que revela a justiça de Deus é a mesma palavra de absolvição dita ao pecador arrependido na confissão ou penitência. O Evangelho é a promessa de perdão dos pecados por causa de Cristo, não uma exigência de novas obras de satisfação.
A doutrina medieval colocava as obras humanas dentro da justificação, induzindo os cristãos, segundo Lutero, à insegurança quanto à graça de Deus. Os cristãos não eram levados a colocar sua confiança no fundamento firme da graça de Deus e da obra redentora de Cristo, mas nas areias inconstantes das obras humanas.
Na prática penitencial (confessionário), central na vida da Igreja da época, o conforto do Evangelho estava soterrado debaixo do medo de não estar suficientemente arrependido, ou de ter deixado algum pecado de fora da confissão, ou de não ter feito obras suficientes para merecer a vida eterna.
Da prática pastoral, no confessionário e no púlpito, e da prática acadêmica, em suas leituras e aulas, Lutero descobriu a importância de distinguir corretamente entre Lei e Evangelho.

ML – Qual a importância da correta distinção entre Lei e Evangelho?
Strelow - Lutero aprendeu a separar a justiça do Evangelho, recebida pela fé, da justiça da Lei, feita de obras.
Em Romanos 1.17, Lutero compreendeu que toda exigência de obras pertence à Lei e que o Evangelho é o anúncio da graça de Deus aos pecadores. A descoberta permitiu a Lutero ler Rm 1.17, e toda a Escritura, à luz da distinção entre a palavra da Lei, que ordena e exige obras, e a do Evangelho, que oferece a graça de Deus. Lutero descobriu que a verdadeira contrição não é exercício humano, mas obra de Deus pela pregação da Lei, e que a palavra de perdão dos pecados, ou absolvição, dá ao pecador arrependido o que Cristo obteve por nós na cruz: perdão, vida e salvação.
O morrer diário do velho homem é obra da Lei (obra estranha de Deus, de mortificação) e o nascer diário do novo homem é obra do Evangelho (obra própria de Deus, de vivificação). A justificação pela fé somente significa que o Evangelho somente revela a justiça ou a graça de Deus, em Cristo.

ML – Como aconteceu e acontece ainda hoje a Reforma da Igreja?
Strelow - A Reforma da Igreja se faz com a pregação da Lei e do Evangelho, porque somente a Lei e o Evangelho produzem o verdadeiro arrependimento e a verdadeira mudança de vida.
Em 1539, em um estudo sobre os concílios, Lutero escreveu que a verdadeira Reforma da Igreja é diária. A Reforma da Igreja está em curso em toda casa, igreja e escola onde a palavra de Cristo é pregada. Pais e mães, professores, pastores são os verdadeiros reformadores da Igreja: uma família reunida em oração e estudo bíblico, segundo Lutero, é um verdadeiro concílio reformador da Igreja; um professor contando histórias bíblicas para seus alunos, ou um pastor ensinando o catecismo, é um verdadeiro papa reformador da igreja.
Se as autoridades da Igreja apenas permitissem a livre pregação do Evangelho na Igreja, disse Lutero em escritos dessa época, também eles se converteriam em verdadeiros pastores do rebanho de Deus e verdadeiros reformadores. Mas a Igreja não tem necessidade, segundo Lutero, de papas, bispos, concílios e outras estruturas que não estejam comprometidas com a pregação diária e livre do Evangelho de Cristo na Igreja.
Onde o Evangelho é livremente pregado, a Reforma da Igreja está em curso. E novos reformadores são formados continuamente nesses mesmos lares, escolas e igrejas.

ML – Para Lutero, qual o alcance da Reforma na vida da Igreja?
Strelow - Lutero não queria uma reforma restrita à teologia ou doutrina, como um tema acadêmico, mas uma reforma que fosse verdadeira renovação da vida cristã. Lutero ensinou os cristãos a colocarem em prática, diariamente, o significado do Batismo, o morrer diário do velho homem e o renascer diário do novo homem.
Nos Dez Mandamentos, segundo Lutero, os cristãos aprendem quais são as obras que devem ser afogadas e mortas com o velho homem e quais são os frutos da nova vida que devem florescer na vida diária. Na Santa Ceia, os cristãos aprendem a receber o pão da vida que os transforma em pão para o mundo em suas vocações e afazeres diários. Essa nova vida é fruto da justificação, pois boas obras seguem à fé.
Essa era a reforma da vida cristã que os contemporâneos de Lutero também esperavam. Lutero não convenceu os seus ouvintes a abandonarem o ideal de Reforma da Igreja que tinham, mas ofereceu a eles um firme fundamento para essa reforma, a graça de Deus, em lugar das obras humanas. A doutrina da obra foi substituída pela doutrina da fé no Cordeiro de Deus. Lutero não deixou de pregar o arrependimento, mas resgatou para todos nós o Evangelho de Cristo, no qual temos perdão, vida e salvação."

Nilo Wachholz
Editor
18/10/2010

Nenhum comentário:

Postar um comentário