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terça-feira, 18 de maio de 2010

SELVAGERIA ADOLESCENTE

Artigo veiculado em ZH, 17 de maio de 2010.

Selvageria adolescente, por Paulo Brossard*
Pretendia escrever um segundo artigo sobre a estranha situação em que estavam envolvidos em polos antagônicos dois serviços do mesmo ministério, mas mudei de assunto, tamanha minha estupefação em face de fato desgraçado ocorrido entre nós, envolvendo dois menores, ambos estudantes, embora não os conhecesse, assim em suas dimensões individuais, como em sua expressão social.

O fenômeno vem sendo enunciado em inglês bullying, ainda que pudesse denominar-se selvageria infantil entre adolescentes. Gostamos de usar palavras de origem estrangeira, mas, no caso, o vocábulo pouco importa, pois o caso em si é que é chocante e alarmante. Sirvo-me da notícia recolhida de jornal, “a prática de bullying levou a um desfecho trágico em uma escola de Porto Alegre. Alvo de gozações de colegas por seu tamanho, o adolescente MMM, de 15 anos, acabou morto com um tiro no peito... o autor do crime, de 14 anos, ...” Eis tudo.

Sempre houve brincadeiras entre guris e suponho que continuarão a ocorrer. Dos tempos de ginásio, ainda me lembro de apelidos, o Sapo e o Sapinho, o Tatu e o Tatuzinho, o Gordo, o Magro, o Banana, o Garnizé..., mas isso nunca foi motivo para desavenças; às vezes, porém, os peleadores usavam os punhos à saída da escola. Agora, contudo, a violência vai tomando formas inusitadas; os “trotes” aplicados aos “bichos” pelos veteranos, entre universitários, impressionam pelo mau gosto e até pela brutalidade, dada a presumida qualificação dos agressores, alguns prestes à conclusão do curso acadêmico, todos privilegiados intelectualmente, já se vê. Em verdade, a violência nas palavras, nos gestos, nas atitudes, tomou conta de tudo e de maneira avassaladora. A televisão, instrumento admirável de influência pedagógica ou não, tornou-se incontrastável; os filmes, por sua vez, geralmente importados, são incomparáveis na variedade de violência; até setores que, em tese, são coadjuvantes do bom convívio, como as torcidas de futebol, por vezes degeneram em selvageria com graves lesões a pessoas.

Por incrível que possa parecer, já viciado o ambiente social, até a lei, confessadamente endereçada ao aperfeiçoamento deste convívio, como o Estatuto da Criança e do Adolescente, pode transformar-se de meio de conflituosidades inesperadas; já houve um professor condenado por haver censurado jovem estudante que sujara parede de sua escola com tintas impróprias. Ainda agora o Cpers/Sindicato foi condenado em razão de procedimento incivil à pessoa da senhora governadora do Estado, em sua própria residência, sem falar em manifestações ruidosas à frente da sede do governo, durante horas a fio em dias sucessivos, como se se tratasse de expressão regular de pessoas incumbidas de ensinar e educar e não se cuidasse de terrorismo desmarcado.

É claro que há tipos e graus de manifestações, mais ou menos adequadas às pretendidas aqui e ali e a de que me ocupo especificadamente nesta troca de impressões. Mas a morte de um jovem por outro também jovem, um de 15, outro de 14 anos, chega a ser assustador. Que se pode esperar dessas crianças, pois de crianças realmente se trata? O fato, a meu juízo, à falta de melhor explicação, parece decorrer de progressiva deterioração de valores humanos em cada um dos setores da vida diária de pessoas comuns, mercê da solidariedade entre eles existente. Por que vem ocorrendo essa deterioração que, antes de ser moral ou educativa, ofende o respeito recíproco que cada um deve a seu semelhante? Qualquer que seja a explicação, o fato é que os atos chegam ao insuportável.

*Jurista, ministro aposentado do STF

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